Como funcionou seu trabalho no ginásio?
Sandra Ahlert – Os servidores da Setcel foram chamados para auxiliar no ginásio já na noite do dia 4 de setembro. Começamos a nos deparar com dura a realidade deixada pela enchente, enquanto recebíamos as famílias atingidas. Esse trabalho de atendimento às pessoas se tornou uma prioridade e assim foi feito todos os dias. Acredito que minha atuação neste período veio da experiência que tive durante a cheia de 2020. Era diretora da Escola Moinhos, que não foi afetada naquele ano, mas funcionou como ponto de apoio aos moradores. Em situações como essa é necessário ter calma, discernimento e força para oferecer abraço e conforto. Eu absorvi essas vivências e foi natural oferecer isso aos atingidos nesta cheia. Foi um trabalho desenvolvido por muitos outros colegas.
De que forma os vínculos surgem nessas situações?
Sandra Ahlert – Em virtude do apoio em 2020 no Moinhos e Marmitt, muitas pessoas ali já me conheciam. Atendi muitos na escola, então eu já era uma referência. Os vínculos surgem porque se colocar no lugar da outra pessoa é o ponto básico nestes momentos, assim como fazer uma escuta atenta e entender as necessidades de cada um. Foram momentos de muito trabalho, pois o local ficava assistido durante 24 horas. Surgem muitas histórias, de muitas pessoas que criam proximidade. Tivemos quase 500 pessoas que passaram pelo ginásio, não conseguia dormir direito nos primeiros dias, mas carrego lições sobre esses vínculos, generosidade, escuta e respeito pelas pessoas.
Como avalia o voluntariado em Estrela?
Sandra Ahlert – Se podemos tirar algo de bom desta tragédia, é a forma como as pessoas se voluntariaram. Estrela foi exemplar. Muitas pessoas que chegavam para auxiliar se preocupavam em escutar a população, tinham um olhar atencioso, perguntavam como podiam ajudar cada um. Perceptível que o auxílio era oferecido de coração, porque encarar a dor do outro desta maneira não é simples. Tem pessoas que, até hoje, encontro na rua e abraço, porque as vezes sinto que agradecer não é suficiente.
Qual história mais marcou?
Sandra Ahlert – Tem histórias que causam dor, mas tem outras que me deixaram sentimento de alegria. Nos deparamos com idosos que não tinham quem se preocupasse com eles. Desenvolvemos a campanha “Adote um Idoso” e tivemos pessoas que abraçaram essa causa. Outra situação que me marcou foi de uma venezuelana que chegou ao ginásio com quatro crianças e havia sido abandonada pelo marido. Ela pediu ajuda para ir até Chapecó, em Santa Catarina, onde a irmã morava. Buscamos meios de viabilizar isso, e a Assistência Social informou que o Conselho Tutelar poderia fazer esse movimento. Neste período, fomos informados que um grupo do Lions Clube iria visitar o ginásio. Na ocasião, descobrimos que o grupo era de Chapecó. Eles se disponibilizaram a prestar o auxílio necessário quando ela chegasse lá. Assim aconteceu.
Como te sente com o fim deste trabalho?
Sandra Ahlert – Foi uma situação de muito aprendizado. Com todas essas dores e dificuldades, devemos pensar em como podemos atuar daqui para frente. De forma individual, percebo que saí fortalecida, principalmente por rever alguns conceitos e ver que a população se uniu pelo propósito de auxiliar o próximo. É uma oportunidade para reavaliar o que fazemos e como melhorar. Fazer nossa parte, respeitar os outros e o que entendemos como fé, esperança e solidariedade.