Mais de 90 horas sem luz, transtornos e prejuízos. Esse foi o saldo que centenas de famílias do interior de Estrela e Colinas voltaram a contabilizar após a passagem de mais um temporal pela região, ocorrido no final de semana. Afirmando estar indignado com a situação que novamente castiga, especialmente, produtores rurais, o prefeito de Estrela, Elmar Schneider, ingressou com uma Ação Civil Pública contra a RGE, responsável pelo fornecimento de energia elétrica. No documento, encaminhado com “tutela provisória de urgência”, o governo destaca as condições precárias das redes de energia.
A queda no abastecimento iniciou na noite de sábado, dia 5, e a situação somente foi normalizada na quarta-feira, dia 9. “É inadmissível que famílias do interior, que têm na criação de animais o seu sustento, fiquem por tanto tempo sem luz, ainda mais quando a origem disso, muitas vezes, é a falta de manutenção, por exemplo, de postes, a maioria ainda de madeira”, declarou Schneider. O município também espera que a concessionária ressarça, pelo menos, os maiores prejudicados.
Em Colinas, as comunidades mais afetadas foram Linha Santo Antônio, Linha Leopoldina e Linha Roncador, onde famílias também ficaram por dias sem abastecimento.
Só na promessa
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Estrela, Rogério Heemann, disse que todas as localidades do interior de Estrela foram afetadas, seja pela queda de árvores sobre a rede ou por postes que não aguentaram a chuva e o vento. “Há postes sustentados por uma corda, como na Linha Geraldo. Lá, pelo menos, 150 famílias ficaram sem luz por todo esse tempo”, critica.
No início do ano, o presidente do STR participou de audiência com o gerente de Negócios da RGE Regional, Humberto Santos. Na ocasião, Santos solicitou levantamento a respeito dos problemas enfrentados no meio rural. “Fizemos o levantamento, identificamos postes e muita falta de poda de árvores, mas até agora nada foi feito”, lamenta.
Mais de 70 horas sem luz
Mateus Beuren, de 26 anos, tem uma propriedade na Linha Wolf, uma das mais afetadas no interior de Estrela. A falta de luz trouxe inúmeros prejuízos, principalmente para a produção de leite. Cerca de 250 litros foram perdidos e jogados fora. “A empresa que fornece energia sempre diz que vai voltar a luz, mas nunca volta. A primeira previsão de restabelecimento era de quatro horas após ligarmos, mas já estamos há 70 horas sem energia. Para tirar o leite precisamos fazer a mão, porque a ordenhadeira não funciona, não conseguimos resfriar e o produto estraga”, lamenta.
A mãe de Mateus, Dalila Beuren, de 69 anos, contou que todos os vizinhos ficaram sem luz. “Com os serviços de casa estamos nos virando. O pouco de água da chuva que conseguimos armazenar usamos para lavar a louça.” Ela também lamentou a perda de alimentos, especialmente carnes. “É uma tristeza.”
Sem trabalhar
Elaine da Rosa, de 45 anos, é fotógrafa e depende de energia elétrica para editar fotos e manter contato com os clientes. No escuro há quatro dias, recebeu a equipe de reportagem do Jornal NG emocionada. “A questão é o descaso da empresa. Liguei tantas vezes e não davam importância. Sem poder trabalhar e tomar um banho decente. Isso é lamentável.”
Conta todos os meses
Na propriedade de Elfride Gehm, de 65 anos, oito vacas produzem, em média, 50 litros de leite diariamente. Com a falta de luz, a família utilizou gelo para conservar o produto. No entanto, só conseguiram resfriar até terça-feira, dia 8. Para tomar banho, eles esquentaram baldes de água no fogão à lenha. “A conta de energia é descontada todos os meses, no mesmo dia, da minha aposentadoria. Nosso gerador da ordenhadeira funciona também a gasolina. É nossa saída. A higiene das ordenhadeiras é que não conseguimos fazer da mesma forma.”
Jonathan Gehm, de 24 anos, filho de Elfride, conta que ao ligar para a empresa a promessa era sempre a mesma. “Sem luz, ficamos praticamente isolados. Tem horas que temos telefone e outras não. Celular sem internet e bateria.”
O que diz a RGE
A concessionária explicou que em Estrela e Colinas os registros de clientes sem energia foram isolados e que as equipes trabalharam durante todo o tempo necessário para restabelecer a luz. Sobre a informação relatada por moradores de que quando técnicos averiguam o estado de conservação de um poste e o condenam, alegariam que ele precisa cair para ser substituído, declarou que “inspeciona periodicamente toda a área de concessão da empresa. As demais situações que fogem ao planejamento, são avaliadas por profissionais capacitados, que fazem a verificação e diagnóstico de acordo com a situação encontrada no local.”
A empresa afirmou que possui um plano de investimentos. Em 2020, teriam investido mais de R$ 3,5 milhões em obras e ações no sistema elétrico de Estrela e Colinas. Já em 2021, entre janeiro e março, os investimentos somariam mais de R$ 878 mil.