O anúncio do encerramento das atividades na suinocultura surpreende associados e provoca ainda mais preocupação. Na propriedade de Sirlei e Ilson Aschebrock, as creches para receber leitões estão vazias. Eles estão entre os cerca de 300 produtores de suínos da Languiru. No início de 2022, fizeram um investimento de R$ 250 mil em uma nova estrutura para ampliar a capacidade da propriedade em Linha Catarina, Teutônia.
Com a iminência de encerramento das atividades, não pretendem iniciar um novo ciclo. Até porque o pagamento do último lote ainda não foi recebido. “Não adianta mais deixar alojar leitão, pois a gente sabe que o prejuízo e a dívida só vão aumentar. E se aumenta para a cooperativa, aumenta pra cima do associado também”, comenta Sirlei.
A esperança é que uma outra empresa do setor se interesse no potencial de produção de dois alojamentos, com capacidade para até 1,2 mil leitões. O casal detalha o sentimento de estar com as creches ociosas. “Isso gera um mal estar em toda a família. A gente não sabe mais para onde vai”, desabafa Ilson.
O financiamento da estrutura antiga, de 2016, ainda está em aberto. As parcelas do novo chiqueiro nem começaram a ser pagas. Ao todo, a construção das duas unidades custou mais de R$ 500 mil. “A gente não vai desistir. Não tem outro caminho. Estamos deixando tudo bem limpinho e organizado”, diz Sirlei.
Outra produtora, que prefere não se identificar, conta que havia deixado a produção de leite quando a cooperativa fechou parceria com a Lactalis. Agora, também busca outra empresa para seguir na suinocultura. “Está bem difícil pelo baixo rendimento da suinocultura. As empresas não se interessam.”
Durante coletiva no sábado, o presidente da Languiru, Paulo Birck, anunciou o plano de recuperação (confira ao lado). Na ocasião, afirmou que a cooperativa precisa de aporte financeiro imediato, sob risco de ter de encerrar as atividades nos frigoríficos de aves e suínos até 10 de junho.
Em termos de faturamento, a cooperativa bateu recorde, com um total de R$ 2,7 bilhões em 2022. No entanto, o resultado líquido foi negativo, também o maior na história da cooperativa. Conforme a prestação de contas, houve prejuízo de R$ 123,3 milhões no período.
Na divisão do bolo, os quatro setores mais relevantes (suínos, frangos, leite e rações) representaram 80,3% do faturamento. Juntos, somam R$ 2,2 bilhões de receita. Os 19,7% restantes se dividem entre produção de carne bovina, supermercados, agrocenter, combustíveis e farmácias. Pelos dados da gestão da cooperativa, a dívida hoje com bancos credores, fornecedores, terceirizados e transportadores ultrapassa R$ 1,1 bilhão.
Informações extraoficiais apontam que o montante poderia passar dos R$ 1,8 bilhão em dívidas, pois existem os compromissos financeiros dos produtores com os bancos, cujos dados ainda não foram apurados.
Preocupação com os agricultores
O presidente regional dos Sindicatos dos Trabalhadores Rurais (STRs), Marcos Hinrichsen, confirma. “Quem vai querer aumentar a produção de suínos em um momento em que a cadeia toda sofre resultados negativos.”
Em cima disso, a representação dos agricultores tem mantido diversos encontros com autoridades regionais, estaduais e até de Brasília, para encontrar soluções e pelo menos minimizar as dificuldades da cooperativa e dos associados.
“Temos mantido contato com líderes setoriais, deputados, e empresas também. Qualquer ajuda agora é importante”. No centro da preocupação do
representante sindical estão mais de 5 mil associados, em especial os cerca de 300 vinculados à suinocultura.
“Sem ter alojamento, não entra renda na propriedade. Como vão ficar aqueles com dívidas? Com financiamentos? Precisamos unir todos os setores e encontrar interessados para continuarem os trabalhos.”
Em reunião com prefeitos, foi apresentada como sugestão emitir um decreto de emergência econômica. A proposta está em análise pelos departamentos jurídicos e poderia estender os prazos para os produtores pagarem financiamentos.
“Difícil enxergar uma luz no fim do túnel”
Presidente da Associação de Criadores de Suínos do RS (Acsurs), Valdecir Folador, acompanha com preocupação o quadro da Languiru. “Estive com os gestores da cooperativa na quinta-feira passada (25 de maio). A situação é muito preocupante. Um frigorífico do porte daquele, com risco de fechar. Será muito danoso para todo o estado.”
O plantel da cooperativa é de 13 mil matrizes de suínos. “Precisamos de muita cautela. Ainda não sabemos de que forma isso está sendo tratado com os funcionários. E me preocupa muito a situação dos produtores, dos associados.”
Muitos cooperados, diz, estão com dívidas nos bancos. “Nos últimos anos, eles investiram. Buscaram financiamentos para preparar as propriedades para as normativas sanitárias”. De acordo com Folador, é preciso se encontrar alguma solução para evitar que o quadro piore, como no caso da dissolvência.
A partir disso, afirma manter diálogo com outras empresas. “Todo o segmento produtivo tem conversado. Estamos buscando interessados para assumir. Se não comprar, pelo menos alguma parceria para manter as atividades. No momento, está difícil ver uma luz no fim do túnel.”
Instabilidade na suinocultura
O presidente da Acsurs reconhece que todo o setor da suinocultura trabalha com resultados negativos. Ainda que o preço do milho e do farelo de soja esteja em queda no mercado internacional, o impacto do custo de produção mais em conta só será sentido no fim do ano. “Hoje, o suíno que está sendo levado ao frigorífico continua sendo aquele mais caro. Como no mercado interno não há um repasse integral desses custos ao consumidor, as empresas estão com margens pequenas ou negativas.”
Junto com isso, toda a cadeia exige capital de giro, seja para garantir a ração para levar às propriedades, ou à indústria manter as linhas em funcionamento. “O ciclo é mais longo. Empresas singulares, ou seja, sem outras atividades para equilibrar as contas, precisam de capital de giro e buscam no sistema bancário. Com a taxa de juros elevada, vemos muitos frigoríficos passando por dificuldades.”
Para os próximos meses, a instabilidade deve continuar. “Os preços dos insumos caíram no mesmo patamar do valor pago no mercado interno. No fim, empatou. O que está pagando mais é a exportação.”
Encerramento no shopping
Entre os anúncios está o fim das atividades Shopping Lajeado. A Languiru está desde 2020 no local com três operações (agrocenter, farmácia e supermercado) e tem um contrato de locação por dez anos.
“Oficialmente não temos nenhuma informação sobre a saída da cooperativa. Ouvimos as manifestações no fim de semana, mas não sabemos quando isso vai acontecer”, conta o gerente do Shopping Lajeado, Luciano Angnes.
Segundo ele, a informação repassada à gestão do centro comercial é que o mercado continua aberto enquanto a Languiru procura um novo parceiro para assumir a unidade. “Não houve um comunicado com datas de fechamento definidas.”
Entre os funcionários, ainda muitas dúvidas, pois não houve anuncio de demissões ou mesmo aviso-prévio. A expectativa é que, em até duas semanas, seja anunciada uma nova rede para assumir o mercado no shopping. Pelo balanço de 2022 da cooperativa, o setor de supermercado representou 10,7% do faturamento total, que passou dos R$ 2,7 bilhões.