“Os caminhoneiros que trazem milho do centro-oeste não querem mais aceitar entregas para o Vale do Taquari”. A afirmação do presidente do conselho da Dália Alimentos, Gilberto Piccinini, ilustra o cenário atual da logística regional.
De acordo com ele, o tempo de percurso torna a viagem mais demorada que de costume. “Se pudessem escolher, os motoristas deixariam a carga no máximo em Lajeado”. Como o milho é insumo básico para a alimentação de frango, gado leiteiro e suínos, a produção da cooperativa de Encantado está com custos mais elevados.
“Tínhamos a perspectiva de aumentar o abate de frango no frigorífico de Palmas, em Arroio do Meio. Não dá, infelizmente. Há muita demora, não tem caminhão, são poucos transportes e custam muito”, frisa Gilberto Piccinini e complementa: “não é só a Dália. Estamos falando de um corredor importante à economia gaúcha. Tudo isso vai interferir na arrecadação de impostos e no desenvolvimento do estado.”
Há diversos pontos de conflito na malha rodoviária do Vale. No acesso à microrregião de Encantado, devido à queda da ponte da ERS-130, o trecho entre Colinas e Roca Sales, em Fazenda Lohmann, virou a principal rota à parte alta.
São sete quilômetros de chão batido. “Esperamos que a promessa do secretário Costella (Juvir, secretário de Transportes do Estado. Ele afirmou ser possível entregar a nova ponte da 130 antes do Natal) seja cumprida. Pois o trecho de Roca está muito ruim. Seguido temos que mandar socorro para desatolar veículos carregados de frango”, afirma Piccinini.
Os outros pontos de gargalos ficam na BR-386. Tanto no trecho ainda em duplicação (nas imediações do Bairro Montanha, em Lajeado), e, em especial, nas pontes (do Arroio Boa Vista e também sobre o Rio Taquari).
Condições da BR-386
Desde a sexta-feira da semana passada, engarrafamentos testam a paciência dos motoristas. “O problema é que nunca sabemos como está. Não há uma informação prévia da concessionária, dizendo os horários de interrupção do trânsito”, reclama o motorista de aplicativo, Wiliam Corrêa.
Caminhoneiro autônomo, Claudio Bartz, transporta tintas e materiais de construção. “Fiquei mais de 50 minutos parado entre Lajeado e Estrela. São pelo menos dois anos de problemas nessa BR-386. Começam as obras, em seguida param. Nunca termina”, critica.
Há três frentes de trabalho. São duas equipes nas pontes (do Arroio Boa Vista e sobre o Rio Taquari). São obras de recuperação dos pilares para contenção e aumento no volume de concreto e base de aço.
Com isso, ocorrem estreitamentos de pista por alguns períodos, diz a CCR ViaSul. A concessionária venceu o leilão para gerir as BRs 386, 101, 290 e 448 em novembro de 2018. O contrato faz parte do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), e a concessionária terá que investir mais de R$ 7,8 bilhões em 30 anos de concessão.
Impacto para 70% das operações no RS
O início da duplicação da BR-386, em 2021, trouxe uma injeção de ânimo para o setor logístico regional, lembra o diretor da Tomasi Logística e vice-presidente do Sindicato das Empresas de Transporte do RS (Setcergs), Diego Tomasi.
“No início, vislumbramos um cenário muito positivo, pois se tratava de um avanço considerável nas condições da rodovia. Agora, depois de tantas interrupções, são pelo menos três anos de problemas no transporte regional.”
De acordo com ele, o RS está atrasado em relação a logística. “Temos poucas rodovias duplicadas. Com pistas simples, o risco de acidente é maior, o consumo de combustíveis também, e isso aumenta o custo logístico.”
Com as reformas nas pontes e a continuidade da duplicação no trecho urbano de Lajeado, a insatisfação aumenta, destaca Tomasi. “Estamos bastante preocupados, porque a BR-386 é um eixo logístico muito importante para o estado, principalmente no trecho Lajeado-Estrela. Essa rodovia junta toda a movimentação que vem do norte, como Passo Fundo e Carazinho, além do próprio Vale do Taquari. Infelizmente, o que temos visto é um atraso constante nas obras, e isso está impactando quase 70% das operações no estado”.
Tomasi destaca que os custos com mais tempo e consumo no transporte representam um acréscimo de 20% na despesa das transportadoras. “Estamos perdendo oportunidades. Muitas empresas que têm origem aqui no Rio Grande do Sul começam a abrir unidades em outras regiões do Brasil, onde a logística é melhor. Isso significa que novos investimentos deixam de ser feitos aqui”, adverte.
Detalhes
Logística comprometida
Trecho da BR-386 está em obras desde 2021. Reforço nas pontes (Arroio Boa Vista e sobre o Rio Taquari), aumentam o tempo de percurso entre Lajeado e Estrela.
Região alta
A queda da ponte da ERS-130, e as condições ruins do trecho entre Colinas e Roca Sales, tornaram o acesso à microrregião de Encantado precário.
Impacto Estadual
Pela BR-386 passam produções de toda a Região Norte. Estimativa da Setcergs aponta que rodovia recebe cerca de 70% das operações logísticas no RS.
Custo
Transportadoras calculam em uma média de 20% o aumento nos custos de transporte frente às interrupções nas estradas gaúchas.
Gargalos
- Obras na BR-386
Problemas constantes na duplicação e nas obras de recuperação das pontes na BR-386, especialmente nos trechos entre Lajeado e Estrela. - ERS-130
A queda da ponte fez com que o trecho da ERS-129, entre Colinas e Roca Sales se torna-se a primeira opção à microrregião de Encantado. Com sete quilômetros de chão batido, a rota passou a absorver um fluxo acima da capacidade da via.